Divulgando Geofísica

 

 

 

O Programa “Divulgando Geofísica” representa uma possibilidade de a Academia ajudar a corrigir o desenvolvimento que a Geofísica tomou em nosso país. Em outras palavras, seu objetivo não é apenas contribuir para a divulgação da Geofísica e para o reconhecimento do profissional em Geofísica, mas também para a socialização de conhecimentos produzidos e acumulados na academia nesta área do conhecimento.

 

Divulgando a GeofísicaLucia Maria da Costa e Silva - UFPA

A palavra Geofísica deriva do grego e significa Física da Terra, tendo sido primeiramente usada por Aristóteles. Segundo a coordenadora do Projeto Divulgando Geofísica, Lucia Maria da Costa e Silva, professora da Universidade Federal do Pará, a Geofísica estuda a Terra a partir da observação de efeitos nos campos físicos e na propagação de ondas (de origem natural ou provocada) produzidos pela distribuição das propriedades físicas dos materiais.

Diferentemente da Geologia, as observações são, portanto, indiretas. O resultado é que é possível a custos menores inferir sobre a natureza dos materiais que jazem abaixo da superfície terrestre, em particular os materiais geológicos, sem a necessidade da coleta direta, inexeqüível em se tratando do interior profundo da Terra. A Geofísica não lida apenas com a Terra sólida, mas também com seus envelopes líquido e gasoso bem como já se estendeu ao espaço, o que não tem apelo apenas futurista: a chamada Geofísica Espacial é fundamental, por exemplo, para a proteção ambiental da Amazônia, já que o sensoriamento remoto é uma técnica geofísica imprescindível para isto.

O desenvolvimento inicial da Geofísica esteve relacionado à observação de fenômenos de grande escala como os terremotos, quase sempre realizada nos observatórios, tipo de estudo referido como Geofísica Global. A maior contribuição da Geofísica foi em nível global: os estudos sobre o assoalho oceânico, o fluxo térmico, a distribuição espacial dos terremotos, a migração dos paleopolos magnéticos e a idade da crosta obtida a partir de radionuclídeos conduziram à síntese mais importante das Geociências: a Teoria da Tectônica de Placas. É a Teoria da Tectônica de Placas, segundo a qual os continentes se movem analogamente a esteiras rolantes, que permitiu compreender a crosta terrestre em larga escala, o que significou, por exemplo, compreender onde procurar petróleo e minerais bem como as regiões nas quais o ser humano poderia viver sem o risco dos cataclismos naturais.

Em 1924, no Texas, foi descoberta a primeira estrutura acumuladora de petróleo através da observação de seus efeitos no campo gravitacional normal da Terra. A partir dessa data, começou a consolidar-se a utilidade da Geofísica para a investigação de feições de dimensões pequenas e rasas, a profundidades passíveis de serem atingidas pela exploração extrativa (profundidade inferior a 5 km), a chamada Geofísica de Prospecção. É na investigação de feições da subsuperfície de dimensões e profundidade relativamente pequenas, quando comparadas a macro feições da Terra Sólida, como depósitos de combustíveis fósseis (petróleo e gás, carvão) e, secundariamente, minerais-minérios, que a Geofísica mais tem se destacado.

Atualmente, por exemplo, é impossível a descoberta de petróleo sem a Geofísica. Por ter sido enormemente influenciado pelo modelo americano de desenvolvimento da Geofísica que se estabeleceu a partir da descoberta do Texas, voltado à prospecção, a Geofísica no Brasil foi confundida no passado como uma subárea da Geologia, embora não tenha tido qualquer ligação com essa Ciência durante a maior parte da história de seu desenvolvimento.

Mais recentemente, a preocupação voltou-se sobremaneira para problemas diversos ambientais, em especial a escassez de água (1.000 m3/hab/ano) que 41 países deverão sofrer por volta de 2025, enquanto outros países sofrerão por apresentar desigualdade na distribuição de suas reservas de água. Este último é o caso do Brasil, que, apesar de dispor da maior reserva hídrica do mundo, tem estados como Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas, Sergipe, Distrito Federal, Ceará, São Paulo e Rio de Janeiro que poderão atingir a escassez. Ao todo serão 2/3 da população mundial vivendo em áreas com recursos hídricos insuficientes. Os lençóis de água subterrânea, que representam 97% da água potável disponível no planeta, podem ser explorados através de poços tubulares. A locação adequada do filtro de um furo é obrigatoriamente feita através da Geofísica, pela chamada perfilagem geofísica de furos de sondagem. Fora essas aplicações, a Geofísica é reconhecidamente útil no monitoramento de problemas ambientais diversos, investigações arqueológicas, paleontológicas e geotécnicas bem como descoberta de pistas e corpos de interesse da Criminalística, entre outras aplicações.

Por isso, em vários países, Geofísica e geofísicos são altamente populares, chegando-se a extremos como no Japão, em que o geofísico alcança status praticamente análogo ao do médico.

Brasil - A Geofísica e o profissional em Geofísica, contudo, são desconhecidos da quase totalidade da população brasileira, independente muitas vezes do seu nível social e econômico.

Há várias explicações para o fato, por exemplo, não sermos um país submetido a abalos sísmicos. A explicação, contudo, mais convincente parece advir da forma como foi introduzida a Geofísica no Brasil.

Até a década de 60, ocorreu a mera importação de técnicos e tecnologia em Geofísica de Prospecção pela Petrobras. Estudos geofísicos em nível global, por outro lado, já vinham sendo conduzidos desde o início do século XX tanto pelo Observatório Nacional do Rio Janeiro como pelo Observatório Astronômico de São Paulo e, mais tarde, também pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), também em São Paulo.

O início da década de 60 foi palco de uma série de reflexões no meio científico brasileiro sobre a alienação da pesquisa científica em relação aos problemas tipicamente brasileiros. Foi entre os físicos que essa discussão foi mais acalorada e também frutífera, gerando, por exemplo, as primeiras medidas para se introduzir a pesquisa em Geofísica na vida científica nacional. Assim, por volta de 1963, reconhecendo como fator decisivo e fundamental ao desenvolvimento sócio-econômico da Amazônia o fomento às Ciências da Terra, um grupo de paraenses liderados pelo Dr. Carlos Alberto Dias, com o apoio do Prof. José Maria Filardo Bassalo, buscou a correspondente formação tecno-científica em centros educacionais do sul do Brasil e, especialmente, no exterior, a fim de reduzir gradativamente a dependência científica e tecnológica então existente.

Cursos de Pós-graduação em Geofísica foram implantados na USP, UFBA e UFPA. A formação de corpo técnico e o desenvolvimento tecnológico tornaram-se expressivos, mas não foi determinante para a criação de Cursos de Graduação em Geofísica. Alguns motivos foram: (i) o mercado para geofísicos ocupado parcialmente por engenheiros e geólogos e (ii) a redução do preço do barril do petróleo e, subsequentemente, dos esforços exploratórios na década de 80, que reduziu a demanda por geofísicos bem como geólogos, engenheiros e todo o tipo de profissional relacionado ao vultoso mercado de hidrocarbonetos.

Ainda assim, em 1984 foi criado o primeiro Curso de Bacharelado em Geofísica no Brasil no Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (USP). Em 1992, foi criado o Curso de Bacharelado em Geofísica na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Finalmente, em 2003, foi a vez da UFPA. Um indício que a criação do Curso de Graduação em Geofísica foi uma medida acertada é que vários alunos do curso já foram aprovadas em concurso para geofísicos e aguardam apenas se formar. Outro seria que, após 2003, surgiram e estão para surgir outros cursos de Graduação em Geofísica, denotando a forte demanda pela qual o setor começou a passar.

Em 1989, existiam apenas 450 geofísicos no Brasil, contra 700 na ex-Alemanha Ocidental, 800 na Itália, 1.500 na Austrália, 1.900 no Japão, 12 mil nos EUA, 17 mil na China, 20 mil na Rússia (Palacky 1989 in Silva 2000). De lá para cá, a situação no Brasil pouco mudou, apesar de suas dimensões continentais e da existência de extensas regiões inexploradas. Estima-se que pode existir uma lacuna de até cerca de 20 vezes a população total de geofísicos no Brasil.

Não é possível, contudo, deixar de olhar para o futuro: as vagas para geofísicos na atualidade são, em parte, circunstancias, produto da renovação do quadro de profissionais de várias empresas. Obviamente, há um reaquecimento do setor bem como há a possibilidade de se usar Geofísica em áreas mais sociais (Água, Ambiental, Geotecnia e outras). No entanto, a corrida fenomenal de profissionais diversos para essas áreas, por um lado, e, por outro, o desconhecimento generalizado seja da população, seja das secretarias de governo e outros sobre o que a Geofísica pode realizar, levaram a uma dura realidade: muito do que os geofísicos podem fazer está sendo realizado (e mal) por outros profissionais. Em suma, nem o espaço convencional para geofísicos sofreu de fato uma expressiva expansão, muito menos o espaço aberto pelas novas demandas está sendo ocupado pelo geofísico com os trabalhos que lhe diriam respeito. Perde a sociedade como um todo, não apenas o geofísico.

(Fonte: Lucia Maria da Costa e Silva, Universidade Federal do Pará – Projeto Divulgando Geofísica)

 

GEOFÍSICA

É a ciência que estuda a estrutura, a composição, as propriedades físicas e os processos dinâmicos da Terra. O geofísico investiga os fenômenos elétricos, térmicos, magnéticos, gravitacionais e sísmicos do planeta. Com instrumentos especiais e leis da Matemática, da Física e da Química, ele mede as forças que afetam a superfície, o subsolo e a atmosfera terrestre. Observa e calcula os movimentos do solo e do subsolo e pesquisa a origem e a atividade dos vulcões, a curvatura do planeta e outras características geofísicas do globo. Detecta e mede a intensidade de terremotos e maremotos, investiga a estrutura das formações rochosas e as propriedades físico-químicas dos mares. Antes da construção de grandes obras, como represas, estradas e túneis, avalia a estabilidade do solo e localiza lençóis de água e jazidas minerais. Pode trabalhar também na prospecção de petróleo.

Abaixo, algumas Universidades no Brasil onde existem cursos de formação do Geofísico:

 

Instituições

Região Centro-Oeste
Distrito Federal: UnB

Região Nordeste
Bahia: UFBA.
Rio Grande do Norte: UFRN.

Região Norte
Pará: UFPA.

Região Sudeste
São Paulo: USP.

Região Sul
Rio Grande do Sul: Unipampa.


 

 

 

Radar verifica qualidade de pavimentação


Radar de Penetração do Solo foi utilizado para
diagnosticar problemas na Travessa Mauriti

por Paulo Henrique Gadelha / março 2011
foto Acervo do Pesquisador

 

Cotidianamente, deparamo-nos com buracos, rachaduras e afundamento em vias públicas. Algumas dessas avarias, além de obstruírem, geram insegurança no trânsito. Esses defeitos poderiam ser detectados antes mesmo que surgissem na superfície do asfalto? Sim. E é exatamente esse o mote da Dissertação "Investigação Geofísica por meio de radar de penetração do solo para verificação de pavimentos", a qual está sendo desenvolvida por Carolina Narjara, no Programa de Pós-Graduação em Geofísica do Instituto de Geociências (IG) da Universidade Federal do Pará (UFPA), sob orientação da professora Lúcia Costa e Silva.

A pesquisa, pioneira na Amazônia, começou no final de 2008 e deve ser concluída até julho de 2011. Seu principal objetivo é mostrar a eficiência do uso do Ground Penetrating Radar (GPR) ou Radar de Penetração do Solo, em uma tradução literal para o português, na verificação da qualidade de pavimentos novos e, também, na verificação de defeitos em pavimentos antigos nas camadas subjacentes ao revestimento asfáltico. "Como o uso do GPR ainda é pouquíssimo difundido no Brasil, a ideia da pesquisa é revelar que, com o uso do instrumento, é possível avaliar a qualidade de obras recém-construídas e identificar os problemas nas camadas abaixo do revestimento, antes que eles apareçam na superfície", explica Carolina Narjara.

Segundo a pesquisadora, o GPR funciona da seguinte forma: uma antena, colocada na superfície da área que se quer investigar, transmite ondas eletromagnéticas de frequência entre 10 MHz e 2500 MHz, as quais  se propagam nos materiais da subsuperfície, sofrendo reflexão, refração e difração.

As ondas refletidas retornam à superfície trazendo informações sobre aquele meio. As informações são detectadas na mesma antena transmissora ou em outra, próxima a esta. O processo é análogo ao dos exames tomografia, ultrassonografia e raio-x. As informações recebidas são registradas em um computador acoplado ao equipamento para serem, futuramente, processadas e interpretadas.

Ideal para prevenção, o GPR é pouco utilizado no Brasil

Carolina Narjara realizou pesquisa bibliográfica sobre outros trabalhos científicos que também analisaram o uso de GPR aplicado a pavimentos e pesquisa de campo nas dependências da UFPA e em um perímetro da Travessa Mauriti, em Belém.

Durante a pesquisa bibliográfica, Carolina Narjara consultou trabalhos de pesquisadores dos Estados Unidos, Canadá e de alguns países da Europa. Um dos objetivos era descobrir o quão está avançado o uso do GPR nesses lugares. Neste sentido, a pesquisadora teve acesso a estudos que tratavam tanto do controle de qualidade de pavimentos novos, como também da utilização do instrumento na identificação de defeitos em construções antigas. O resultado dessas pesquisas foi a constatação de que o GPR já é usado com regularidade no exterior, contribuindo, de maneira eficaz, para a constante melhoria da qualidade das vias públicas nesses países.

Já no Brasil, o uso da ferramenta ainda é incipiente. Para a orientadora da dissertação, de fato, estamos atrasados, em relação a outros países, quanto ao uso do GPR. "No Brasil, preocupa-se mais com o conserto de estradas. Não há uma busca efetiva para evitar os problemas de pavimentação e compreender suas raízes. É comum no País, por exemplo, buracos que são tapados voltarem a aparecer após um curto período de tempo. O GPR é o equipamento ideal para monitorar esses defeitos e executar o controle de qualidade da pavimentação, porque dá uma visão tridimensional das camadas da subsuperfície. Esse procedimento já acontece com regularidade em alguns países", avalia a professora Lúcia Costa e Silva.

Em campo, Carolina Narjara analisou um trecho do asfalto recém-construído nas proximidades do Centro de Excelência em Eficiência Energética na Amazônia (Ceamazon), nas dependências da UFPA, para avaliar se as especificações preconizadas no empreendimento foram cumpridas. Os dados ainda estão sendo analisados e os resultados irão sinalizar se a obra foi executada de acordo com o Projeto.

Em Belém, Travessa Mauriti teve pavimento analisado

Outro local visitado por Carolina Narjara foi a Travessa Mauriti, em Belém. No trecho escolhido, há um antigo problema que, até o momento, não foi resolvido em definitivo. Trata-se de buracos que já receberam reparos várias vezes, porém o defeito reaparece dentro de pouco tempo, causando transtornos para os que transitam nas imediações. O GPR ajuda a compreender problemas recorrentes em pavimentos antigos, o que, neste caso, não está relacionado à qualidade do pavimento, pois, se fosse assim, os buracos não apareceriam em pontos específicos, mas em toda a superfície do asfalto.

Embora ainda não haja resultados conclusivos desse monitoramento, a pesquisadora levanta duas hipóteses a partir da análise preliminar dos dados, "a Mauriti comporta uma extensa galeria que integra o sistema de esgoto daquela área. Então, o solapamento do asfalto pode estar ocorrendo exatamente em pontos de vazamentos da tubulação da galeria. Com o GPR, será possível indicar quais são esses pontos. Outra hipótese seria que a tubulação da galeria, por estar entupida, não suporta mais o fluxo de água, o que leva à infiltração e ao transbordamento", considera Carolina Narjara.

Parceria – A pesquisa conta com o apoio de professores do Laboratório de Geofísica Aplicada (LGA) da Universidade de Brasília (UnB). Essa parceria, de acordo com a professora Lúcia Costa e Silva, é antiga. Entre os projetos já implementados pelas duas universidades, destaca-se a busca pelos restos mortais dos envolvidos na Guerrilha do Araguaia, ocorrida entre 1972 e 1974.

O GPR não se limita à verificação de pavimentos. De acordo com as pesquisadoras, a ferramenta também é aplicada em investigações arqueológicas, prospecção mineral e de água subterrânea, investigação criminal, entre outras áreas.

Depois de concluído e publicado, o estudo poderá contribuir para o desenvolvimento local, com a possível popularização do instrumento entre os órgãos do município. "Essa dissertação tem como função mostrar o funcionamento do GPR em pavimentos. Isso, praticamente, ainda não havia sido feito em lugar nenhum no Brasil. Na Amazônia, é inédito. Diante desse contexto, seria interessante que a pesquisa pudesse auxiliar a popularização do instrumento em órgãos públicos, como na Secretaria Municipal de Urbanismo (SEURB), para que as competências que lhes cabem sejam cumpridas com mais eficiência e rapidez", conclui Lúcia Costa e Silva.

 


fonte: Jornal da Universidade Federal do Pará, Beira do Rio . Ano XXV Nº 92, Março de 2011